Sempre que lia alguma notícia da maior montanha da Terra sentia um misto de medo e de uma ansiedade enorme de estar lá. Acho que sempre, a todo instante, estamos tentando romper “altitudes”, por qualquer motivo. Seja na conquista de um novo amor, um novo trabalho, uma travessia a nado, um novo projeto, enfim, será que consigo chegar lá? Quem tem pleno conhecimento dos próprios limites? Qual é o seu EVEREST? E quando os impulsos de tentar o impossível é mais forte? Os riscos aumentam! Precisamos ter foco nos objetivos para conseguir romper as “altitudes” existentes. Assim foi minha experiência rumo ao Everest, em 2008. Uma barreira histórica como produtor de reportagens para minha vida! Você não retorna para casa a mesma pessoa. Tudo é tão forte e poderoso naquele lugar que quando retornamos nos sentimos mais vivos e ao mesmo tempo muito pequenos. É o sentimento de que não somos nada diante daquela imensidão e que não pertencemos àquele lugar. Essa é a sensação quando conseguimos as nossas vitórias. Transforme todos os objetivos dentro da sua profissão no seu “EVEREST” a conquistar. Eu ainda tento chegar no cume, E você? Já conquistou seu EVEREST?
Ah! O Everest! Faria tudo novamente! Desde adolescente ouvia histórias do Himalaia. Histórias de vida e de morte. Quando se escala a maior montanha do planeta essas duas situações caminham contigo lado a lado. São duas as possibilidades de chegar até o acampamento base. Pela China, aonde você chega de carro, e pelo Nepal, aonde você chega à base, caminhando por 60km, saindo da cidade de Lukla. Meu sonho não era escalar pois para essa finalidade tem que ter uma preparação muito forte. Quem não pensar assim está correndo sérios riscos. Já não é fácil chegar ao acampamento base! Escalar até o topo é mais complexo e para quem não é um escalador profissional, a dificuldade aumenta potencialmente. Muito se fala na comercialização da montanha. Muitas agências internacionais ganham muito dinheiro levando pessoas preparadas ou não para chegar até o topo. Leiam o livro do escritor americano JON KRAKAUERK, que vocês irão compreender melhor e em mais detalhes o que significa pagar muita grana pra chegar no cume. Vale muito a pena a leitura do livro, “NO AR RAREFEITO”, que é fácil de entender o que estou dizendo. Foram momentos desafiantes da história do alpinismo para simples mortais e para profissionais que tentaram escalar e chegar no topo da maior montanha da Terra, com 8849m de altitude. Outro livro que vale a leitura é o "FANTASMAS DO EVEREST em busca de Mallory e Irvine”, que narra uma expedição na busca de utensílios de 2 alpinistas que supõe, se se eles chegaram antes dos percursores Edmund Hilary e o sherpa Tenzing. A expedição encontrou o corpo de Mallory. Eles poderiam ser os primeiros a escalar o monte Everest. Essa possibilidade seria real se encontrassem a máquina fotográfica com fotos da conquista do cume que comprovariam a conquista. Os 2 morreram na descida e nada foi encontrado a não ser os corpos e alguns objetos pessoais. Esses 2 livros marcaram muito a minha percepção sobre o que significa essa montanha nas profundezas do meu imaginário. Mas nunca eu poderia imaginar, que alguns anos depois, eu estaria caminhando pelas mesmas trilhas utilizadas pelos dois homens que conquistaram o EVEREST.
Minha aventura pelas trilhas do Nepal foi em 2008. Realizei meu sonho de chegar até o acampamento base, mas não foi fácil. Foi dolorido e penoso subir e descer montanhas de formações monumentais. Uma catedral deslumbrante das montanhas do Himalaia até chegar aos pés da “MONTE SAGARMATHA”, em nepalês, e “CHOMOLUNGMA”, na língua tibetana. O acampamento base fica a 5.364m de altitude feita de 12 a 20 dias pelas trilhas, logicamente dependendo da disposição de cada um. Quem me levou foi meu amigo e irmão de muitas aventuras jornalísticas, Clayton Conservani e 1 guia nepalês, Rham.
A viagem saindo do RIO é longa, com escala em Amsterdã, e de lá para Katmandu, capital do Nepal. São aproximadamente 24h de viagem. O aeroporto de Katmandu tem uma estrutura precária e a minha primeira impressão foi de uma desorganização absurda. Mas parecia uma feira do que um aeroporto. Pegamos nossas bagagens e partimos para o nosso hotel, no bairro do Tamel, aonde a maioria dos turistas se hospedam. Essa região é a Babilônia do Nepal. É onde se encontram escaladores e trilheiros do mundo todo. O comércio durante o dia é frenético e nos primeiros três dias dedicamos as compras. Eu não tinha equipamento adequado para chegar até o acampamento base, e quando falamos em compras, a disposição aumenta. Lá tem todo o tipo de mercadoria que vocês podem imaginar, desde o haxixe até as roupas de montanha mais sofisticadas das grandes marcas como A NORTH FACE e MARMOT. Logicamente que fomos nas lojas nepalesas porque eram as mais baratas. Eram das marcas “NORTH FAKE”. Isso mesmo, todas de fabricação chinesa e muito idêntica as originais. E olha que tenho até hoje essas roupas. São de boa qualidade e serviram ao propósito. Gastamos quase US$ 1.500,00 (mil e quinhentos dólares), em roupas e equipamentos. O Clayton já tinha vindo algumas vezes para o Nepal e quase não precisou de equipamentos. Ele já tinha quase tudo. Apenas uma observação importante! Lembro que essa produção foi uma parceria entre o SPORTV e a TV GLOBO. Nesse ano eu era o editor-chefe do Zona de Impacto e o Clayton era repórter do Esporte Espetacular, com isso o orçamento da produção ficou mais barata para ambos os departamentos. Eu já tinha tentado ir com o Clayton para o Everest quando era produtor no Esporte Espetacular. Foi quando ele tentou chegar ao cume, mas não conseguiu. Faltou pouco pra ele chegar lá. O nosso diretor de Esportes, Luís Fernando Lima, achou arriscado eu ir com o Clayton nessa época. Hoje acredito que foi a decisão acertada. Tudo tem seu tempo! Não saberia dizer por quais motivos, mas agora eu estava lá, no Nepal, e nada agora impediria de chegar ao acampamento base, mas não tinha a menor ideia do que estava por vir. Estávamos ali para cobrir jornalisticamente a escalada dos brasileiros RODRIGO RAINERI e o cirurgião plástico EDUARDO KEPKE, que tentariam escalar pela primeira vez a montanha. O Rodrigo tinha o objetivo de escalar sem o auxílio de oxigênio! Poucos conseguiram chegar lá sem cilindros de oxigênio. Todos os anos, centenas de montanhistas de todas as partes do planeta se deslocam para o Himalaia em busca do sonho de chegar ao cume. No entanto menos de 5% desses alpinistas conseguem realizar o feito de escalar e descer sem o auxílio de oxigênio. O único brasileiro a conseguir esse feito foi Vítor Negrete, mas morreu na descida, na zona da morte! Ele está enterrado no C3, na face Norte do Everest. Vejam essa estatística de brasileiros que se arriscaram na montanha mais alta da Terra, com 8.849m de altitude.
Números Brasileiros - FONTE: portal - extremos
- Primeiro brasileiro a escalar o Everest 3x foi Rodrigo Raineri, face sul (NEPAL), em 2008, 2011 e 2013;
- Brasileiro mais jovem a escalar o EVREST foi Carlos Santalena, com 24 anos;
- Brasileira mais jovem a escalar o EVEREST foi Karina Oliani, com 31 anos;
- Brasileiro mais velho a escalar o EVEREST foi Manoel Morgado, com 53 anos;
- Primeira brasileira a escalar o EVEREST foi Ana Boscarioli, em 2006;
- Os anos com mais brasileiros no cume do EVEREST com 3 brasileiros, 2006,2022 e 2013;
- Brasileiro que escalou as 2 faces do EVEREST com sucesso – Valdemar Niclevicz;
- 2014, foi o ano com mais brasileiros no EVEREST, 6 no total: Carlos Santalena, Cid Ferrari, Roman Romancini, André Freitas, Fatima Williamson e Rosier Alexandre, mas nenhum deles atravessou o Kumbu Ice Falls, a parte mais perigosa da escalada, por conta de uma avalanche que matou 16 sherpas e um montanhista. Um dos momentos mais trágicos da temporada no acampamento base do EVEREST.
Nossa logística estava baseada no uso do kit correspondente com a utilização do celular TURAYA, que era o único que conseguiria transmitir dados do acampamento base. Teoricamente seria direcionar a antena para o satélite e pimba! As imagens chegariam no Brasil. Foram gastos US$ 15.000,00 (quinze mil dólares ), na aquisição do equipamento e compra de dados para a transmissão, que já estava em mãos do Rodrigo Raineri que partiu com mais antecedência para o Nepal. Nosso plano era começar a gerar conteúdo, em NANCHE BAZAR, capital do povo sherpa, a partir dos 3.440m de altitude. Tudo corria normalmente até aqui como o planejado. No último dia antes de iniciarmos a nossa caminhada conhecemos o nosso guia RHAM que nos alertou de irmos com calma e bem devagar para que tenhamos uma adaptação a altitude graduada e que não prejudicasse a saúde de ninguém. Já comecei a ficar mais preocupado e comecei a pensar na possibilidade de não conseguir chegar. Não! Tinha que eliminar esse pensamento. Só poderia pensar em CHEGAR no meu “EVEREST”! Tudo pronto! Hora de partir rumo ao acampamento base do Everest, a 5.364m de altitude.
Acordamos cedo e partimos para o aeroporto de Katmandu com nossos equipamentos e o nosso guia. Fizemos o check in e embarcamos para LUKLA, o ponto de partida para a caminhada de 60km até o acampamento base, e para minha surpresa era um monomotor muito parecido com os aviões da primeira guerra mundial. Ao entrar na aeronave e me acomodar a aeromoça me forneceu algodões! Eu fiquei pensando para que serviriam aqueles chumaços de algodão? Quando o piloto deu a partida deu pra entender a finalidade. Era um barulho ensurdecedor! A aeronave não era pressurizada e todos os barulhos do motor, do vento, eram perceptíveis. Era pra ser um alívio o pouso em LUKLA, mas a pista só tem 300m e tem um aclive considerável que serve para aliviar a velocidade no pouso. Esse aeroporto é considerado um dos mais perigosos do mundo! A cidade de Lukla fica a 2.860m de altitude.
Depois dessa “aventura aérea”, já começamos a nossa caminhada rumo ao acampamento base. Eu levava uma mochila com aproximadamente 15 KG. O primeiro dia foi lindo! Caminhamos por planícies lindíssimas com flores e Yakes em campos esverdeados. Foi um trecho curto aonde paramos para pernoitar no primeiro “lodge”, que são hospedagens bem simples que abrigam os alpinistas e aventureiros ao longo das trilhas. A luz ainda era acessível e o banho quente apenas com água fervida, que era servida em baldes pelo proprietário do lodge.
Primeiro e segundo dia de caminhada rolou tranquilo, mas a partir da entrada do Parque Nacional de Sagarmatha, que protege uma das áreas mais cobiçadas dos Himalaias, as trilhas com subidas e descidas começaram a ficar mais radicais. Esse parque é rodeado por montanhas acima de 7 mil metros de altitude e a fiscalização do governo nepalês são necessárias por conta do turismo de aventura e alpinismo crescentes. É uma das fontes de renda mais importantes do Nepal. Aonde conquistar a montanha é pano de fundo porque é ela que nos conquista. Uma parede se forma no horizonte que atrai qualquer mortal. É como um imã físico. É o altar dos sacrifícios! Nossa produção pagou US$ 12.000,00 (doze mil dólares), apenas para ter acesso até ao acampamento base, eu e o Clayton. E tem fiscalização. Se as autoridades nepalesas te pegarem fora dos padrões contratados você pode ser preso, pagar uma multa pesada e até mesmo ser extraditado.
Ao passar pelo portal, depois de apresentar as credenciais começa a caminhada rumo a NAMCHE BAZAR, a capital do povo SHERPA, que são os locais dos himalaias. A capacidade pulmonar desse povo é superior em 50% a nossa por justamente estarem adaptados totalmente a grandes altitudes, e sem eles é impossível chegar lá, pois são eles que carregam nossos equipamentos até o acampamento base, e no caso dos alpinistas, até o cume. O nepalês KAMI RITA SHERPA escalou 28 vezes o EVEREST!
A capacidade desse povo é tão impressionante que eu vi durante a subida na trilha um europeu em posição fetal sendo carregado dentro de um cesto de palha por um sherpa devido a uma embolia pulmonar. O resgate só é possível por helicóptero ou a pé. Quem tem grana vai de helicóptero. O resgate é feito no acampamento base ou até aonde um helicóptero pode chegar. Quem não tem grana desce carregado por um custo menor na esperança de se recuperar durante a descida. Essa imagem me deixou impressionado! No trajeto até Namche passei pela primeira ponte extendida. Começávamos a subir pela beira de um rio caudaloso com água dos glaciares, e quando vi a ponte, me perguntei se conseguiria. A trilha começava a ficar difícil e meu um pânico repentino me assustava. Aquela imagem do gringo enorme sendo carregado como um bebê me deixou muito assustado. Sinceramente achei que não fosse conseguir. Descansamos um pouco e comecei a ver as pessoas atravessarem a ponte de aproximadamente uns 100m e fiquei paralisado. Ela balançava de um lado para outro, e abaixo dela aquele rio medonho com águas nervosas, existia um vazio de altura de aproximada de uns 150m de altura. “Ali começava o neném a chorar e a mamãe não vê!” Só via em filmes aquela situação e agora era a hora de encarar o medo. Desculpem o termo, mas atravessei com o cu na mão aquela ponte, mas depois que você atravessa tudo fica mais fácil.
Mais fácil? Nunca! Depois desse primeiro desafio começamos uma subida interminável até Namche. Bazar Durante a subida vi uma senhora de uns 70 anos de idade me passar como uma velocidade humilhante carregando um balaio cheio de gravetos nas costas. Na sequência vi um sherpa com dormentes de madeira bruta, nas costas, subindo com desenvoltura, enquanto eu parava constantemente para respirar. Começava ali um sofrimento terrível. Quem viu o filme do SHEREK lembra do burrico perguntando a todo instante:”Já chegamos?” Devo ter feito essa pergunta umas 10 vezes ao Clayton. A subida demorou umas 4h. Quando chegamos na última escada da trilha eu já não conseguia mais ficar em pé. Uma dor muscular brabíssima! Andava me escorando num muro de pedra. Fui carregado até o quarto e dali não sai por umas 24h. Pedi encarecidamente que alguém do lugar arrumasse alguma massagista para as minhas pernas. Estava sentindo muitas dores. A massagista chegou e eu pude relaxar e a parar de sentir cãimbras . Nunca me senti assim na minha vida e estávamos apenas a 3.600m de altitude! Não sai nem pra jantar. Acho que dormi por mais de 14h de tão cansado que estava.
No dia seguinte acordei com dores pelo corpo inteiro. Sempre joguei bola na minha vida mas nunca senti tantas dores como aquele dia seguinte. Não conseguia me levantar. Mas era preciso me alimentar e hidratar. Na altitude esses 2 elementos são deveres de casa diário e obrigatórios! O alimento serve como um fornecedor de proteínas e carboidratos porque a queima é enorme, por conta do frio e do desgaste físico. O frio começava a apertar! A água serve para que o equilíbrio orgânico seja mantido e também para evitar as dores de cabeça. Nessas condições é necessário tomar pelo menos 4 litros de água diariamente!
Foi uma alegria encontrarmos o Rodrigo e o Eduardo no café da manhã. Conversamos sobre a nossa logística e o Rodrigo achou melhor ficarmos em Namche Bazar para me recuperar fisicamente porque estava muito debilitado devido ao esforço que fiz até ali. Enquanto isso ele e o Edu seguiriam a trilha até o acampamento para começar a aclimatação para o ataque final ao cume.
Eu, Clayton e Rham, ficamos 4 dias em Namche, que é um povoado simples com pessoas muito receptivas e humildade de fazer inveja a qualquer cidadão do mundo. Tem um comércio de roupas de frio muito baratas e conheci o prato mais tradicional no Nepal, o DAL BHAT, é um prato típico indiano mas que nessa altitude dá uma vitalidade incrível. Consiste em arroz cozido no vapor com um guisado de lentilha cozida e outro ensopado de leguminosas que é chamada de DAL. E BHAT significa arroz cozido. E pimenta a gosto! Uma delícia pra quem é Vegano. Para carnívoros ele vem com carne moída de Yake, o boi do himalya.
É um mundo a parte. Tive a oportunidade de conhecer SHREE HIMALAYA SCHOLL, que atende todas as crianças da região. Algumas crianças andam pelas trilhas durante 3h para assitirem as aulas. E um pouco acima de Namche Bazar tive a primeira visão do MONTE EVEREST, no lugar chamado EVEREST VIEW. Nesse ponto pude ver o quanto estávamos distantes e muitas surpresas estavam por vir durante a trilha.
Já se passaram 6 dias desde que saímos de Katmandu e na partida passamos novamente pelo EVEREST VIEW, e pude observar novamente o tamanho do meu desafio. No caminho nos deparamos por uma visão bizarra. Um SADU e um “assistente”, pedindo qualquer donativo para a sua causa. É normal nas trilhas do Nepal você encontrar essa figuras exóticas pedindo dinheiro. Eles gostam muito de Haxixe! Demos nosso donativo, algumas rúpias, e seguimos em frente, afinal não queríamos que nenhum mal nos parasse ou impedisse nosso caminho, vai que o SADU tivesse algum poder? kkkkkkkkkkkkk rimos muito e dali em diante o Clayton passou a me chamar de SADU. Essa trilha é um sobe e desce de matar qualquer um. Você desce até 3.250m para atravessar o rio KOSI DUDH e sobe novamente a 3.870m até chegar a TENGBOCHE a 3.870m. Nessa trilha você já consegue ver o AMADA BLAM, LOTSE E O EVEREST. Uma imagem deslumbrante das maiores montanhas do Himalaia. Quando chegamos ao vilarejo eu estava com febre e com as pernas bambas. Nos alojamos num lodge muito simples a luz de velas e o banho…, bem o banho não rolou dessa vez pois estava num estado crítico. Nessa trilha você sente frio, calor, calafrios, tira o casaco, bota o casaco e chega em estado terminal. Nem queria comer mas o Clayton me obrigou senão eu poderia ficar pelo caminho. Forcei a barra comi rapidamente e fui dormir com febre. Nessa noite sonhei como nunca antes na minha vida. Dormi pesado e o Clayton disse que ronquei como um bom gerador! Misteriosamente ali ocorreu uma mudança radical no meu organismo. Comecei a sentir que meu corpo estava se adaptando aquela realidade. Acordei, tomei leite de Yaki e um arroz mechido com ovo, e que estava delicioso. Fomos conhecer e gravar o mosteiro budista de TENGBOCHE, que foi construído em 1923, e foi destruído por um terremoto em 1934, e reconstruído posteriormente. A importância desse mosteiro é que todos os alpinistas que passam por ali vão consultar os monges se a montanha o aceita ou não para a escalada. Se o monge negar é porque será muito perigosa a escalada e eles aconselham a não ir. Se o monge liberar é porque a escalada será tranquila. Cada um segue o caminho que achar melhor. Como não iríamos escalar seguimos caminho. Pedimos autorização para gravá-los mas não nos permitiram fazer imagens.
Pra cima e avante! Passamos mais uma noite em Tengboche e sentia que estava mais forte e apto pra seguir adiante. Estava mais confiante! Mas tudo tem sua cota de sacrifício. Minha chegada a PERICHE, próximo destino, foi sofrida. Tivemos que ficar 2 dias pra me recuperar. Ficamos num lodge mais confortável pra recuperar as energias. É um vale entre montanhas exuberantes e lá está um memorial em homenagem aos alpinistas que morreram ao tentar escalar o EVEREST. O nome de Vitor Negrete está lá cravado no metal pra posteridade. O lugar é pequeno e muito simples. Um rio formado pelas águas descongeladas das montanhas cortam a paisagem bucólica. Já estávamos no oitavo dia de caminhada e essa parada foi estratégica para chegar ao objetivo maior, o acampamento base!
Partimos de Periche bem cedinho e vimos um amanhecer de tirar o fôlego, e quando deixamos a planície veio uma subida íngrime que nuca acabava. Foi muito dolorosa essa subida. Parei várias vezes pra recuperar o fôlego. Já estávamos a mais de 4 mil metros de altitude e o oxigênio cada vez mais escasso. Até que chegamos ao local mais sagrado dessa trilha. Nos deparamos com diversos totens (pilhas de pedra), como lápides, contendo nomes, fotos, datas, mensagens deixadas por parentes, amigos e pessoas queridas, de reconhecimento e votos de descanso. Muito triste e envolvente estar em meio àqueles monumentos em homenagem aos mortos que sucumbiram durante a escalada. Um lugar localizado a aproximadamente 4.600m de altitude.
O frio já começava a apertar e aceleramos o passo pra chegar a LOBUCHE, que é o penúltimo ponto antes do acampamento base. Chegamos a um lodge mais movimentado e mais sujo. Nada ali é confortável. Gente estranha entrando e saindo a todo momento. Não via a hora de chegar logo ao acampamento base. pernoitamos ali para na manhã seguinte irmos a Gorek Shep, a última parada antes de chegar ao nosso objetivo, “O MEU EVEREST"! O acampamento base.
Décimo segundo dia e partimos para a nossa última parada, o acampamento base. Quanto mais perto mais longe! Já não via a hora de chegar. Partimos cedo de Gorek Shep e em 5h horas de caminhada começamos a avistar o acampamento bem distante. Era apenas um ponto pequeno. A trilha até lá é feita sobre pedras sem trilhas definidas. Muito fácil torcer o pé, e com as pernas bambas e o oxigênio a 50%, dá pra imaginar como estava o sonhador. Sim! Aqui não é lugar para meninos! Também não é lugar para os seres humanos. Tanto que a permanência máxima aqui nesse lugar é pouco mais de 2 meses para quem não mora aqui. Quanto mais me aproximava mais sentia dores nas pernas e no meu corpo. A respiração muito ofegante e tive que parar algumas vezes pra recuperar. E não tinha mais subidas. A falta de oxigênio é crítica pra quem vem do nível do mar. A minha chegada foi caótica!. Cheguei cambaleando e quase caindo no chão. Pedi uma cadeira porque já não aguentava mais ficar em pé, e com as pernas novamente moles, que não obedeciam. Minha respiração era como se estivesse nadado 3 km numa piscina. Foi cruel mas cheguei! Fiquei umas 2h sentado numa cadeira me recuperando. Comi e fui dormir. Fiquei uns três dias prostrado pelo esforço descomunal que fiz pra chegar aos 5.364m de altitude. Andava por 5min e cansava. Apenas em uma noite tive três apnéias durante o sono, que é a acordar com falta de ar, ou seja, minha vida estava um caco! Só depois de 3 dias ali é que comecei de fato o trabalho. Enfim a montanha começava a me aceitar ali naquele ambiente.
Meu corpo já começava a se acostumar com aquela atmosfera. As noites eram muito frias e dormir com uma garrafa de pet nos pés com água fervida era fundamental para aquecer o corpo. Eu utilizava "3 peles” pra dormir com algum conforto. Explico melhor. A primeira pele é uma camiseta de manga comprida de algodão com uma calça comprida do mesmo tecido, mais fino. A segunda pele é um casaco com uma maior proteção. E a terceira pele já é um casaco poderoso para suportar o frio da madrugada, que girava entre menos dez a quinze graus negativos. E tudo isso dentro de um saco de dormir pra suportar frio de menos trinta graus! Lembro bem de acordar durante a madrugada, ligar a lanterna, e observar no teto da barraca, cristais de gelo. Sim! Um frio de rachar! Quando não era o frio que nos despertava, ouvíamos os estrondos de avalanches que aconteciam nas laterais do Kumbu Ice Fall, o lugar mais temido pelos alpinistas. Isso acontecia a qualquer hora do dia e da noite, e também nos arredores. Parecia tempestade se aproximando mas eram as avalanches por conta do degelo das várias montanhas que ficam ao redor do acampamento base.
Numa das manhãs, dos 22 dias que ficamos lá, acordamos bem cedo pra gravar a movimentação no acampamento base. Primeiro fomos conhecer o hospital que é montado todos os anos para atender os primeiros socorros e até casos mais urgentes, seja tombo, congelamento de membros inferiores e embolias pulmonares, casos mais comuns ou extremamente perigosos entre os escaladores. Era bem próximo as nossas barracas mas tinha um lago bem grande que se formou das águas dos glaciares. Entrevistamos alguns médicos mas não tinha nenhum paciente sendo tratado. Uma tenda bem grande e com equipamentos e médicos para qualquer emergência. Não esqueçam desse lago que mencionei pois mais adiante algo muito impressionante irá acontecer.
Deixamos o hospital e fomos almoçar! A fome nessas condições quase não existe mas o frio e a falta de oxigênio nos obriga a beber muita água e a se alimentar, quer queira ou não. Não há outra opção! Se você não se alimenta regularmente o risco de adoecer é real. Não dá pra facilitar aqui. As condições são precárias e debilitar o organismo pode acabar com a expedição. Enquanto a gente circulava pelo acampamento gravando matérias, Rodrigo e o Edu se aclimatavam subindo e descendo os acampamentos 1 e 2 ou até o 3. E isso era feito sob um esforço enorme. Não é fácil você ficar "passeando”o tempo todo pelo Kumbu Ice Fall. É um trecho recheado de gretas ligadas por escadas de alumínio que são montadas pelos sherpas antes do início da temporada, pois ali a cada ano, uma nova configuração das gretas surge. Gargantas profundas que qualquer queda pode levar a morte! Muito difícil e arriscado recuperar um corpo quando cai numa dessas gretas.
Nosso cozinheiro, um sherpa franzino, chamado Maker, não era um "chefe de cozinha", mas cuidava da nossa alimentação com muita competência, e curiosamente o cara fazia uma pizza maravilhosa! Naquelas condições uma pizza era um luxo! Logicamente que tinha muita comida enlatada, muito noodles e macarrão. Mas quando cozinhava o DAL BAHT…. Hummmm, que delícia! Pedíamos sempre pra ele ir devagar na pimenta. Nossa água mineral durou pouco tempo. O consumo do elemento essencial na montanha passou a ser água dos pequenos riachos que se formavam na base do Kumbu Ice Fall. Ela era fervida e atendia as nossas necessidades. Refrigerante nem pensar! Era chá ou TANG. Apesar de todas as dificuldades e a falta da comida de casa, em nenhum momento passamos mal em nenhum dos dia que "moramos”ali, naquele lugar pra lá de diferente. “EXISTEM VÁRIOS “EVERESTS, DENTRO DO EVEREST”. Romper a barreira do nosso cotidiano é uma luta constante pra quem vem pra cá! Seja dormir, acordar, andar, comer e até defecar, requer um esforço contínuo pra quem vem do mundo "civilizado". São “ALTITUDES”para cada “ATITUDE”, a ser pensada ou calculada para qualquer ser humano. Aqui a fronteira é o '“LIMITE” de cada um. Quem vem pra cá se sente na obrigação de se adaptar ao meio para aprender o principal no ser humano, a RESILIÊNCIA, a PACIÊNCIA, além da prática da 'HUMILDADE". Aqui você não é melhor que ninguém. É apenas mais um nessa Babilônia. Quem vem aqui, pra viver e conviver nesse ambiente certamente nunca mais será o mesmo. Tudo tem um novo significado, um novo valor e um novo propósito. Quer mudar como ser humano? Aqui é o lugar! Banho? Bom, isso só aconteceu quando terminou a expedição porque foram 22 dias apenas com lenços umedecidos. Não dava e nem tinha condição técnica de tomar banho diariamente. O lencinho de bebê funcionou que foi uma beleza! Coisinha mais querida!
Descobrimos logo no início que não tínhamos condições técnicas de fazer os vivos programados para os telejornais pois a nossa antena não suportava a carga de dados para essa transmissão. Focamos nosso objetivo nas edições, e logo após, a transmissão de dados. Percebemos também que as matérias teriam que ser curtas. Não mais que um minuto! Quase todas as tvs que estavam ali também estavam utilizando o sistema TURAYA, que era o único satélite que atendia a todos ali no acampamento base, seja para ligar ou transmitir dados. A possibilidade da transmissão também era limitada. Normalmente a transmissão de uma matéria de 1 minuto, pelo kit correspondente durava aproximadamente 3h! Muitas vezes a transmissão caia devido a demanda local. Eu e o Clayton resolvemos nos dividir para otimizar a nossa produção. Ele gravava e trazia para eu ficar editando e monitorando a transmissão. A edição era na plataforma da ADOBE PREMIER PRO. O Clayton sempre foi um repórter dinâmico. Sabia produzir, gravar e reportar. Muitas matérias dele no Esporte Espetacular, ele produzia e gravava sozinho. E eu estava agora ali com ele justamente para otimizar essa produção mas tínhamos um problema sério na transmissão de dados e no carregamento das baterias que alimentavam o lap top, a câmera, rádios e todos os equipamentos do Rodrigo e do Edu. Algumas vezes tínhamos que aguardar a recarga das baterias para voltar a trabalhar na edição e gravação de conteúdo. Com isso as horas de sono ficaram comprometidas. Mas tem o lado positivo. As noites no acampamento base são fenomenais. Vários véus de noiva branco formados pela neve que desce das montanhas contrastando com o céu coalhado de estrelas. Simplesmente inesquecível!
Mas a nossa missão era gerar conteúdo para o Brasil, dos brasileiros e de tudo que estava acontecendo ali. E tivemos a ajuda de 2 amigos no Brasil que foram fundamentais para a exibição do nosso conteúdo. Tino Marcos que era nessa época editor chefe do Globo Esporte, e o editor executivo Marcelo Outeiral. A exibição do conteúdo no Zona de Impacto já estava garantido mas era preciso mostrar nosso trabalho para um telejornal de rede nacional, e conseguimos com a ajuda deles, ter um quadro diário no Globo Esporte mostrando as particularidades e curiosidades da nossa expedição a 5.364m de altitude. Não foi fácil! Como disse anteriormente, tínhamos problemas para a transmissão de uma matéria de 1 min. Foi diante dessas dificuldades que me surgiu uma ideia. Gerar o conteúdo de 1 minuto em 10 blocos de 10 segundos! No Brasil o mágico editor de imagens Eric Romar reunia esses bloquinhos numa matéria completa de 1 min. E foi assim que a gente trabalhou! Ufa, conseguimos romper um “EVEREST TÉCNICO". Sim, temos a todo momento “EVERESTS" a conquistar em nossas vidas. Dessa forma mostramos o canadense que tentava escalar a montanha sem os 10 dedos gangrenados pelo congelamento, mas não conseguiu, pela terceira vez! Também levamos em rede nacional o japonês mais velho a escalar o Everest, YUICHIRO MIURA, hoje com 91 anos, escalou o Everest em 2003, 2008 e 2013.
Tudo corria dentro da normalidade. Rodrigo e Edu iriam atacar o cume em 2 dias mas o transformador do gerador queimou! Isso faltando poucos dias para o fim do nosso trabalho. Sem cargas nas baterias, não teríamos câmeras, fotos, edições e nem ligações para os familiares. Mais um “EVEREST” em nosso caminho! Estar ali e não conseguir registrar o feito dos brasileiros, depois de tudo que a gente fez, seria como entrar num pesadelo e não acordar mais! Levar esse fracasso para o Brasil seria patético! Tentamos arrumar emprestado algum transformador reserva de alguma agência por ali, nada! Tentamos consertar, nada! Eis que um sherpa deu uma ideia de tentar arrumar uma peça com um amigo em Lobuche! Seria um dia de ida e outro de volta. Não tínhamos outra alternativa. Rodrigo e o Edu adiaram por mais um dia a ida ao cume. E a temporada já estava chegando ao fim. Algumas agências já estavam partindo do acampamento junto com as conquistas. Enfim, nos restou aguardar a chegada do sherpa. Foi grande a preocupação e frustração com o que estava acontecendo!
Na manhã seguinte ainda tínhamos carga nas baterias da câmera e o Clayton me acordou assustado:"Claudinho acorda! rápido! Vem aqui ver um negócio estranho!". Acordei rápido! Peguei a câmera e fui até aonde ele estava. Quando cheguei não acreditei no que estava vendo! Lebram do lago perto do hospital? Ele já não existia mais! A água sumiu na totalidade do dia para a noite! A água escoou como se tivessem retirado a tampa de um ralo. Isso nos mostra como ali tudo está em movimento. Foi sinistro ver aquilo. Numa madrugada e bum! A água sumiu!
Passado o susto ainda tínhamos 1 bateria em mãos mas essa guardaríamos para o retorno dos brasileiros do cume.
Dia seguinte o Sherpa chegou com 2 transformadores feitos com caixas de papelão de celular NOKIA. Até bem pouco tempo atrás eu ainda tinha uma delas mas com o tempo acabou se perdendo. E foi um desses "transformadores", que nos salvou. Ficamos tão felizes por termos conseguido vencer mais esse “EVEREST". Considero um feito! Graças ao sherpa conseguimos finalizar o trabalho. Agora a bola estava com os brasileiros Rodrigo Raineri e Eduardo Kepke.
Eles sairam às 4h da manhã do dia seguinte e a partir dai ficamos sem comunicação por 2 dias. Uma preocupação constante nos abalava. Agora era o EVEREST a vencer, literalmente. O tempo colaborou bastante. Poucas nuvens, céu limpo no dia 27/05/2008, Rodrigo e Edu chegaram ao topo do Everest pela primeira vez! Levaram 17h pra chegar lá. Recebemos a ligação do Rodrigo que nos deu a notícia e logo enviamos a mensagem para o Brasil. Dia seguinte a tarde os recebemos com muita alegria na base do Kumbu Ice Fall. A pior parte de uma produção de alto risco é vencer a morte! Quando tudo acaba bem é uma sensação maravilhosa!!!!
Ainda tivemos o gostinho de andar no início do Kumbu com os equipamentos mas vou te dizer um negócio, é muito difícil andar com toda a indumentária pra escalar. Atravessar a pequena ponte de alumínio é muito complicado pra quem não está acostumado. Andar com os grampões, que é um tipo de calçado adaptado para aderir ao gelo é também desconfortável. Enfim, apenas um gostinho pra não dizer que andei um pouquinho com os equipamentos de escalada.
Tudo certo! Tudo transmitido! Hora de voltar pra casa! Já deu! Só que não! Apareceu outro “EVEREST”pra escalar. Devido a repercussão do nosso trabalho no Brasil, a diretora do GLOBO REPÓRTER Sylvia Saião, pediu pra gente produzir um programa sobre “AS TRILHAS DO NEPAL". Caraca! Outro desafio gigante! Produzir em 1 semana um DOC para um dos programas de maior prestígio do telejornalismo do Brasil! Eu e o Clayton ficamos numa alegria que não dá pra descrever aqui. Tudo acertado pelo telefone. Era a hora de sair de um lugar que marcou a minha vida. “EU CONSEGUI ESCALAR O MEU EVEREST QUE SONHEI"! Tentei o impossível e consegui o possível! Posso afirmar, como homem, que não fui mais o mesmo depois dessa viagem.
Depois de 22 dias, estava mais forte, APENAS NO ACAMPAMENTO BASE, estava mais magro. Perdi 18 kilos. Quando você fica muito tempo na altitude aumenta na circulação sanguínea a quantidade de glóbulos vermelhos, aproximadamente 50%. Glóbulos vermelhos (eritrócitos ou hemácias): são células sanguíneas que carregam hemoglobina. Eles são responsáveis pelo transporte do oxigênio dos pulmões para os tecidos e pela retirada do gás carbônico para ser eliminado pelos pulmões. Bastava olhar para as palmas das mãos e ver que algo tinha mudado. Chegamos em Namche Bazar em 3 dias!!! Descemos que nem trem bala! Mas sem perceber estava prejudicando meus joelhos. Quando você sobe quase não há impacto mas quando você desce o funcionamento do joelho é outro. Só fui perceber os problemas meses depois mas outros “EVERESTS”, iriam surgir em nossas vidas.
Mas observem nas fotos abaixo a diferença entre o gordinho e o magrinho!
Primeira providência na chegada a Namche Bazar era falar com a família. Internet melhor, condições melhores pra falar com todos da família. Liguei pra minha mulher e falamos durante um tempo, até que ela começou a chorar. Hum! Não achei legal! Tem alguma coisa estranha!. Perguntei a ela:”ISSO É SAUDADE AMOR? ACONTECEU ALGUM PROBLEMA? O QUE ESTÁ ACONTECENDO? Ela me deu respostas evasivas o que me deixiu com uma pulga atrás da orelha. Via naquelas lágrimas algo muito maior! Terminei a ligação muito preocupado e pensei logo em voltar para o Brasil assim que chegasse a Katmandu, mas tinha a produção do Globo Repórter! Não podia falhar ali com o Clayton naquele momento. Conversamos e decidi ir até o fim. Dia seguinte partimos para Lukla e dali pegar o avião para Katmandu mas as chuvas fizeram com que ficássemos mais 3 dias presos em Lukla. Foi agonizante essa espera. Liguei novamente para casa e novamente a minha mulher chorou! Já fiz inúmeras viagens e nunca tinha visto minha mulher chorar. Fiquei preocupado com meus filhos. Será que aconteceu algo com eles? Ela me respondia que não, que estava tudo bem.
Chegamos em Katmandu, e no dia seguinte já começamos a produzir o Globo Repórter. Andando pelo centro histórico da cidade jamais imaginaria que um dos maiores terremotos do Nepal colocaria abaixo muitos dos monumentos que estavam em pé e que mataria aproximadamente 10 mil nepaleses e turistas oito anos depois, em outra produção com o Planeta Extremo. Não dá pra falar das trilhas do Nepal sem falar da sua história. Temos que mostrar a resiliência desse povo e do respeito que tem pelas montanhas. Por mais pobres e humildes que sejam os nepaleses, eles são receptivos a qualquer povo do planeta. Você pode andar pelas ruas do Nepal sem medo. katmandu é uma favela a céu aberto mas o que não falta a esse povo é dignidade e amor próprio.
Uma curiosidade nas estradas do Nepal. Estávamos finalizando o trabalho para o Globo Repórter e fomos para a trilha mais usada por aventureiros e turistas quando olhei atentamente para o acostamento da estrada e pedi para o motorista para imediatamente o carro.”Por favor, pare o carro!”. Clayton estava cochilando e acordou assustado: “O que foi Claudinho?”. Respondi:"Clayton isso aqui é planta de maconha!
É impressionante! Mas todas as estradas do Nepal tem plantas de CÂNHAMO, muito parecida com a CANNABIS SATIVA. Ela Tem baixíssimo teor de THC, tetrahidrocanabiol, que é a substância alucinógena da cannabis. Rimos muito daquela situação. O piloto ficou sem saber porque estávamos rindo, muito!
Mas a ansiedade em voltar pra casa era enorme! O que será que aconteceu em casa? Será que minha mulher resolveu se separar de mim? Vocês podem achar que maluquice pensar isso, mas minha mulher durante o ano de 2012, quando estava produzindo conteúdo para o programa planeta extremo, ela marcou num calendário quantos dias fiquei fora de casa. Dos 365 dias do ano eu passei em casa apenas 98 dias no Brasil! Ou seja, passei 267 dias trabalhando fora de casa! E sempre reconheci que a minha profissão que abracei deixava uma ausência muito grande para uma mulher e 3 filhos pequenos. Passei muitos anos da minha vida profissional ausente. Foram muitos aniversários, dia dos pais, natais e ano novo longe deles, mas agora tudo estava muito estranho.
Depois de 40 dias no Nepal, cheguei em casa! Mas outro EVEREST me apareceu na frente, mas foi ela que escalou! Olhei para os olhos dela e perguntei o que houve? Ela apenas me respondeu com o olhar para eu observar na cintura dela. Havia uma cicatriz enorme, e que parecia ser uma cesariana! Olhei incrédulo e ela que me disse:"TIVE UMA GRAVIDEZ TUBÁRIA ROTA E QUASE MORRI ENQUANTO VOCÊ ESTAVA NA MONTANHA". Desmontei no sofá e choramos juntos. Mais calmos ela me contou o que aconteceu. Ela é neuropsicóloga, e estava atendendo a uma cliente, quando repentinamente desmaiou e começou a sangrar. Dali ela só acordou num quarto de hospital depois de feita a cirurgia para a retirada da uma das trompas. Esse "EVEREST", eu nunca escalei. Foi FHODA! Fiquei chocado com o relato dela e passou um filme na minha cabeça desses 40 dias que fiquei fora de casa. Senti uma vontade enorme de parar ali e ficar cuidando da minha casa, da minha família. Não queria mais estar longe tanto tempo com medo de perder alguém que amo muito, que é minha família, mas todos temos o nosso “EVEREST” de cada dia. Cabe a nós escalarmos da melhor maneira possível, afinal os obstáculos de uma montanha serve para que possamos melhorar como seres humanos. As dificuldades que surgem são para serem vencidos. Todos estamos no limiar entra o sucesso e o fracasso, a vida e a morte. Quando se sentir desafiado pelo seu “EVEREST", apenas vá em frente! Como diria o montanhista britânico George Mallory. Quando um repórter lhe perguntou certa vez porque desejava escalar os 8.848 metros do EVEREST, Mallory respondeu simplesmente: “PORQUE A MONTANHA ESTÁ LÁ”.